Nunca
na história da humanidade se registrou tantos direitos, conquistas e
espaços, destinados especificamente à infância; estamos vivendo um
momento inusitado, repleto de atrativos e opções de toda natureza, que
vão cativando cada vez mais as nossas crianças e adolescentes. A criança
desde sua concepção, ainda na vida intrauterina já está envolvida nessa
lógica, e com o nascimento, em contato com seu primeiro grupo social
que é a família já se insere, no envolvente mundo das mídias sociais e
do consumo, por extensão. E uma vez inserida neste, fará uso cada vez
mais acirrado de tudo que lhe é oferecido.
E a escola? Como esta instituição poderá se preparar para responder às
novas demandas destes pequenos seres tão autônomos? Discutir o papel da
escola; os desafios e perspectivas da educação contemporânea em meio a
uma realidade tão excepcional e tão complexa não é tarefa fácil.
Voltamos a ressaltar o importante lugar ocupado pela criança, em uma
sociedade onde ela é quem decide o que comer, o que vestir, o que
assistir. Onde, como e quando deve ir. Enfim, vive em conformidade com
tudo que lhe é ofertado, muitas vezes indiscriminadamente.
A educação primeira, (aquela que a criança recebe em casa), já não é
mais a mesma e nem poderia ser, mediante as transformações ocorridas na
própria constituição da família, que deixou de ser “a família nuclear”,
constituindo-se nos novos “arranjos familiares”.
Eis ai um paradoxo; como seria possível à instituição escolar atender a
essa nova clientela, com novas características, novas expectativas,
novos modos de se posicionar no mundo; sem apresentar nenhuma mudança
substancial em seu modo de pensar e de agir, onde até mesmo a mobília
apresenta-se inalterada, desde sua criação?
O que se constata é a negação coletiva do óbvio. Para o bem, ou para o
mal, a escola calcada nos moldes arraigados de outrora não responde
mais, às necessidades dessa nova demanda que ora se apresenta. Em seu
livro “Redes ou paredes – A escola em tempos de dispersão”, Paula
Sibilia destaca um enunciado do filósofo Gilles Deleuze que confirma
exatamente este fenômeno. “Já faz mais de duas décadas, portanto, que
esse filósofo detectou a implantação gradativa de um regime de vida
inovador, apoiado nas tecnologias eletrônicas e digitais”.
Com a invenção da televisão, a humanidade passa por uma transformação
conceitual inusitada. Desde o princípio constata-se o fascínio exercido
pelas imagens televisivas, que passam a fazer parte da vida das pessoas
de forma tão constante que se naturaliza socialmente como parte da
própria família; não sendo possível sequer imaginar a vida cotidiana sem
esse aparato. A criança quando chega a ser matriculada em uma
instituição escolar já possui anos, ou meses (se considerarmos alunos de
creches ou berçários), de contato intenso com esse recurso audiovisual.
São combinações perfeitas, minimamente articuladas entre som, imagem e
mensagem. Produzidas para envolver plenamente, cercando a
individualidade e influenciando fortemente a subjetividade humana. Isso
sem mencionar os apelos categóricos dos anúncios de bens e produtos, que
são apresentados incessantemente através das bem elaboradas
publicidades.
A criança normalmente passa boa parte do tempo exposta aos apelos
midiáticos proporcionados pelas tecnologias digitais, e quando está na
escola, o que lhe é oferecido, (inclusive os conteúdos escolares),
apresenta-se como insuficiente, se considerarmos tudo que já viu, ouviu e
viveu. Percebe-se uma insatisfação generalizada.
Cada vez mais, somos inseridos nas redes sociais, onde tudo acontece ao
mesmo tempo, onde todos são emissores e receptores, sem uma hierarquia
estabelecida previamente. Esse movimento nos permite encontrar no mesmo
lugar, entretenimento, informação e conhecimento, de forma concomitante e
ágil, não condizendo com a realidade vivida pela escola. Assim, não é
de se estranhar que toda essa nova forma de conhecimento entre em choque
com a escola, nos moldes que já conhecemos e insistimos em manter.
Paula Sibilia, (2012) aponta para um abismo estabelecido entre a escola e
os recursos midiáticos deste início de século.
Diante dessa revolução informacional, a escrita alfabética e a leitura,
tão bem recomendadas pela escola, não podem permanecer inertes. Nós
educadores, pais e professores, não podemos fugir da responsabilidade.
Não podemos continuar fingindo que não está acontecendo nada. Os
próprios alunos nos dão pistas, de que algo está acontecendo. Essa
apatia tão seriamente registrada na maioria das escolas nos dá dicas,
revelando a necessidade de mudança, de revisão de postura.
A mídia possui um poder de influência extremamente eficaz, e hoje, mais
do que nunca, dita formas de viver e de agir. Tudo o que se consome
passa indubitavelmente pelo crivo das mídias sociais.
Um exemplo básico são os aparelhos de celulares. Não importa a classe
social, a renda familiar ou a localização geográfica; uma grande maioria
do alunado em todo o país faz uso deste recurso, (em algumas
localidades mais, em outras menos), tanto dentro, como fora da escola,
tanto no período do recreio como no momento da própria aula; seja para
se comunicar, para ampliar conteúdos escolares ou simplesmente para
aliviar o tédio das aulas cotidianas. Não queremos julgar se isto é bom
ou ruim, nem tampouco emitir qualquer juízo de valor. Simplesmente
queremos provocar a reflexão.
Não conseguimos vislumbrar outra possibilidade de lidar com o uso dos
aparelhos celulares na escola, que não seja fazer uso desta ferramenta a
favor do conhecimento. Seria algo descomedido disputar espaço com estes
recursos midiáticos, tão recheados de conteúdos, imagens, cores, sons….
A situação fica ainda mais estarrecedora quando destacamos o poder de
persuasão da publicidade, de modo geral. Esta nos atinge de forma
central, tratando toda uma coletividade de forma particular, parece
responder a todas as perguntas, preencher todos os espaços. O ser humano
se converte, (diante dos nossos olhos, porque somos nós mesmos), em uma
grande e única massa homogênea de consumidores. Estamos cada vez mais
aptos a consumir, numa corrida frenética em busca de novas tecnologias,
novas marcas… Novos sentidos.
E a escola? E nós, pais e professores? Como vamos lidar com o quadro que
ora se apresenta? É preciso refletir cuidadosamente sobre estas
questões, lembrando que, para novas demandas são necessárias novas
respostas.
(*) Claudia Leite Brandão, Mestranda pelo Programa de Pós-Graduação em Educação-PPGEdu/CUR/UFMT – cau_brandao@live.com
(*) Claudia Aparecida Nascimento,
Mestranda pelo Programa de Pós-Graduação em Educação-PPGEdu/CUR/UFMT –
claudia-elucas@hotmail.com